Se houve alguma coisa que esta pandemia nos trouxe foi a certeza de que temos de ser flexíveis, já muito se sabia que essa era uma habilidade fundamental, nas empresas, nos líderes e gestores de equipas. Mas agora ela teve de ser rapidamente incorporada nas famílias, e é fundamental desenvolver essa competência a nível pessoal e quanto mais cedo a ensinarmos, mais fácil se torna de a colocar em prática.
Muitas das vezes flexibilidade é confundida com falta de assertividade, ou até pensamos que são pessoas que não sabem o que querem, que não defendem o que acreditam, pessoas que andam ao sabor do vento.
Mas tão importante como defender o que acreditamos é saber quando temos de nos adaptar às mudanças que acontecem à nossa volta, se o contexto se altera, se as premissas mudam então porquê manter o mesmo pensamento a mesma posição, a isto chamamos a diferença entre Fixed Mindset x Growth Mindset, se quisermos traduzir à letra temos: mente rígida x mente de crescimento, por qual vocês querem optar?
O que ganhamos então em desenvolver uma Growth Mindset? Em desenvolvermos a nossa flexibilidade? Acima de tudo capacidade de adaptação, capacidade de dar a melhor resposta às mudanças, e que essa resposta seja rápida, ou seja torna as mudanças prazerosas e vistas como um desafio em vez de dolorosas e limitantes.
Este tempo de quarentena, obrigou-nos, como famílias a reinventar o nosso dia-a-dia e o mais desafiante, é que não foi só no início, mas tem sido uma constante, exatamente porque as nossas necessidades também vão alterando e com um nível acrescido de dificuldade que é o de não haver qualquer previsibilidade no que vai acontecer!
Ora se no início os pais me perguntavam pelo que fazer com os filhos em casa, precisavam de atividades que entretecem as suas crianças (entenda-se filhos e pais), pois nenhum deles sabia o que fazer com todo aquele tempo.
Seguiu-se o caos em conciliar o teletrabalho estando todos em casa 24h sobre 24h e ainda somar todas as tarefas de casa e refeições. E a catástrofe foi quando começaram as aulas, em que os pais agora tinham de trabalhar em casa, cuidar de todas as tarefas, ser informáticos, conseguirem em tempo útil aceder às várias plataformas e metodologias com que cada escola e professor se organizam e como muitos me dizem, ainda serem professores!!
É com todos estes ingredientes que vejo famílias em stress, desesperadas e sem saberem como lidar.
O primeiro ponto fundamental a ter em conta é: se tudo mudou então porque é que continuamos a fazer da mesma forma? Ou porque é que queremos fazer tudo e cumprir todas as tarefas e papeis? Esta pressão é colocada por quem?
É importante parar para refletir, qual o nosso papel enquanto Pais, o que queremos transmitir e ensinar aos nossos filhos?
E cada família irá encontrar o que lhe faz sentido, não há fórmulas exatas nem soluções fechadas, não há certo nem errado, mas sim o que é verdadeiro dentro de cada casa. Antes de entrarem no automático pensem que quero eu adquirir com tudo isto que está a acontecer, e o que quero eu que os meus filhos adquiram e desenvolvam?
Muito se tem falado no impacto imediato e a
longo prazo que esta quarentena nos tem causado, seja a nível das empresas, do
trabalho de forma geral, das escolas, das famílias e claro está da saúde entre
muitos outros campos!!!
Mas e nas nossas crianças?? A reação imediata é que é péssimo, gera
insegurança, medo, o isolamento traz irritabilidade, desinteresse,
distanciamento do grupo de amigos, menos exercício físico… Mas das crianças e
jovens que acompanho e que vou vivenciando pelos meus filhos e os seus amigos,
é que basicamente a quarentena para eles é uma “seca”!
Claro que toda esta situação atinge os mais
novos, mas o como, já depende em grande parte de nós adultos, é óbvio que esta nova
realidade não é boa para ninguém, mas a forma como a encaramos a forma como
decidimos vivê-la e como queremos que os nossos filhos a vivam está diretamente
ligada à forma como nós pais, responsáveis ou cuidadores gerimos toda esta nova
realidade.
O que tenho assistido é que eles reagem de uma
forma muito mais tranquila a tudo isto, muito mais do que nós adultos. A
verdade é que para eles a utilização de vídeo chamadas, aulas on-line, não é
novidade, talvez antes os pais não deixassem estar tanto tempo em frente aos
écrans e por isso agora nem é mau de todo!
Para muitos o facto de estarem mais tempo com
os pais e poderem fazer mais atividades até tem sido benéfico. Têm
experimentado coisas que nunca tinham tentado, uns fazem bolos ou até o jantar,
jogos diferentes de tabuleiro, aulas de ginástica em família ou até meditação.
As possibilidades são imensas e a oferta também.
Claro que em algumas situações as crianças
estão com medo que um parente, nomeadamente os avós, adoeça, ou sentem-se
inseguros de sair à rua, surgem questões sobre a morte e os medos associados, e
naturalmente têm saudades da família que não vive com eles, dos amigos e de
brincar livremente. Ou crianças em que os pais são profissionais de saúde e
vivem mais de perto o risco. Tudo isto são realidades que acontecem em muitas
casas, e nestas ainda é mais importante ajudar as crianças a perceber que
sentimentos tudo isto gera, é importante fazê-los perceber que a única
responsabilidade que devem ter é com as suas atitudes, ou seja o que podem eles
fazer para se sentirem mais seguros, ou para terem atividades que gostam, o que
depende apenas deles e que se fizerem pode melhorar a situação!
A forma de eles reagirem depende em grande
parte da forma como os pais estão a reagir, eles vão-nos espelhar, modelar as
nossas atitudes e aqui é fundamental estarmos atentos se o que dizemos é
congruente com o que sentimos, eles pressentem quando não bate certo.
É importante que os pais sejam claros e não
escondam informação, não quero com isto dizer bombardear os nossos filhos com
os problemas, nada disso, mas sim explicar, adequando à idade de cada um, o que
se está a passar e como nós, pais nos sentimos perante isso.
A forma como esta situação atinge as crianças
depende em grande parte da forma como deixamos que ela nos afete e principalmente
como vamos lidar com ela.
Eu acredito que em todas as situações há algo
de bom que podemos retirar, há um desafio para enfrentar e não existe maneira
melhor de ensinar os nossos filhos se não pelo exemplo.
Sendo assim que exemplo queremos ser para eles
nesta situação de quarentena, que marca queremos deixar, que marca queremos com
que eles fiquem?
Podemos aproveitar esta situação para os
ajudar a lidar com a frustração, a criarem resiliência, a serem criativos e
encontrarem novas formas de fazer as coisas e coisas novas para fazer,
intensificar a união da família e a sua capacidade de se auto regularem.
Por isso sim, esta pode ser uma excelente
oportunidade para fortalecer os mais novos para o futuro, pode e deve ser
encarado de forma a retirarmos o maior partido do que se está a viver.
Qualquer pessoa cresce e aprende mais com os
erros com a adversidade. Para que todo este sacrífico não seja em vão vamos olhar
para o que é preciso mudar. E para o que cada um individualmente pode fazer,
esse é um olhar que podemos ensinar os nossos filhos a ter, o olhar da
responsabilidade perante como me quero sentir diante desta situação, da
responsabilidade do que depende de mim para me sentir bem.
Para que as marcas de toda este panorama sejam
o mais positivas possíveis e para que sirva para fortalecer para o futuro nós
pais, podemos para além de dar o exemplo usar algumas estratégias simples:
Primeiro de tudo ajude as suas crianças a
expressarem-se sobre o que sentem, sem minimizar, sem ridicularizar acolhendo e
aceitando. Este momento pode ser mais difícil do que parece pois não estamos
habituados a expressar os nossos sentimentos, normalmente isso é visto como uma
fraqueza, mas é um passo fundamental para podermos agir na direção do que
queremos. Também nós pais estamos habituados a tentar resolver por eles, a
dar-lhes uma solução de imediato, infelizmente esta situação não tem uma
solução e muito menos imediata, vamos permitir que cada criança encontre a sua
forma de lidar com o problema, que ela própria diga as estratégias que serão
úteis.
Podemos fazê-lo estimulando a que eles
encontrem dentro deles as respostas, ou seja perguntar em vez de afirmar:
Como é que te queres sentir?
O que podes fazer para te sentires dessa
forma?
O
que depende só de ti e que se fizesses iria fazer toda a diferença?
Que mais poderias propor?
Como vais organizar os teus estudos?
Como poderás ajudar nas tarefas da casa?
O que gostarias de fazer de diferente?
Ou seja quando perguntamos aos mais novos o
como, primeiro de tudo estamos a passar uma mensagem, que não é expressa, mas é
entendida por eles da seguinte forma:
“Eu acredito em ti e por isso te pergunto e
peço a tua contribuição, em vez de mandar e dizer-te o que deves fazer”
Como tal estamos a estimular a autonomia, a
criatividade, e quando permitimos que eles coloquem em ação o que propuseram
isso gera compromisso, confiança e auto estima.
Perante as respostas dos mais novos, valorize,
valorize, valorize, mesmo que não seja possível fazer, mas o facto de se
expressar e contribuir já é um passo enorme e de verdade eles trazem soluções
incríveis.
Sendo viável para toda a família, implemente a
ideia do seu filho, quando são eles a dar a resposta o nível de compromisso e
empenho é enorme, gera sentido de responsabilidade porque sentem que não podem
desiludir, afinal de contas foram eles que propuseram. E sendo bem sucedidos a
auto estima aumenta, assim como a confiança neles próprios e gera a ideia de
que são capazes.
Esta estratégia é válida para tudo, para criar
as novas rotinas, para os novos métodos de estudo, para estabelecer limites e
perceber que os pais também tem de continuar a trabalhar apesar de estarem em
casa, para as tarefas de casa, para as relações entre irmãos, e principalmente
para aprenderem a lidar com problemas tão graves e inesperados como a situação atual.
Para que percebam que podem ter medo, podem estar assustados, podem até estar
fartos e irritados de estar em casa, mas que só depende deles mudarem as suas
atitudes para terem resultados diferentes para sentirem de maneira diferente,
independentemente do contexto, independentemente da idade. Sim as crianças já
tem capacidade de alcançarem as suas próprias soluções , só precisam que
acreditem nelas!
Apoie os mais novos através do exemplo,
através das suas atitudes, sem esconder, sem mentir, com sinceridade e
assertividade e dê espaço para que também eles contribuam para o bem estar de
toda a família.